quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

No Coração do Mar

O filme, pra quem não sabe, é inspirado no livro da história de Moby Dick, aquela baleia branca assassina que todo mundo já conhece. Herman Melville é um escritor em crise profissional. Ele precisa emplacar um sucesso de vendas, e não somente por uma questão financeira, mas principalmente pra se auto afirmar como autor. Thomas Nickerson é um amargurado ex-caçador de baleias, e o único tripulante ainda vivo da expedição do navio Essex (feita há mais de trinta anos). Um tem o que o outro precisa. Um homem com uma história de vida interessantíssima pra ser contada e outro querendo contar.


A trama faz os estômagos mais "treinados" embrulharem, mostrando com precisão como se tira o óleo de uma baleia. Vale esclarecer que os baleeiros precisam voltar pra casa com centenas de barris desse óleo para serem bem vistos como profissionais do mar. Como já se imagina, a baleia branca deixa os homens à deriva. Eles vivem em condições desumanas, tendo menos do que o mínimo pra sobreviver. E é aí que a história ganha mais intensidade. Se os homens não têm o que comer e algum tripulante morre, adivinhem o que será feito? Enfim, também preciso falar da experiência em 3d, que não faz muita diferença. O visual é bonito, mas não melhora e nem fica mais interessante em terceira dimensão. Aquele foco em alto-relevo que salta aos nossos olhos com a tecnologia 3d não se destaca tanto.

"No Coração do Mar" traz um roteiro com realidade, mas não muito diferente do que já vimos. O ponto acertado é o passado e o presente sendo apresentados com igualdade. O público consegue acompanhar uma fase sem esquecer da outra. Os personagens estão presentes com a mesma importância nas duas etapas da trama. Não há muita originalidade no filme, parece que estamos assistindo uma mistura de várias obras. Mas temos uma breve reflexão sobre o homem contra a natureza, trazendo um gancho importante pra ser discutido. A primeira cena da baleia caçada, com o último esguicho misturando água e sangue, é um dos pontos altos da história. Apesar de não haver grandes surpresas, ou aquela sensação de ser algo repetido, eu gostei. A tristeza do naufrágio emociona e silencia o espectador. Depois de uma experiência dessa, eu não entraria no mar nem pra tomar banho.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

O Clube

Pablo Larraín apresentou ao público um dos filmes mais polêmicos dos últimos tempos. O chileno O Clube é praticamente uma afronta à Igreja Católica. A história se passa em uma casa em uma cidadezinha pequena, onde um grupo de padres vive em confinamento. Eles são afastados da Igreja por algum tipo de mau comportamento. Há o padre pedófilo, o
que foi conivente com crimes da ditadura militar, o traficante de bebês e etc. Cada um daqueles religiosos tem uma espécie de "currículo negativo" contra tudo que não se espera de um padre, e para não irem pra cadeia eles precisam viver aquela reclusão religiosa obrigatória.

O filme é muito interessante, mas não tem nenhum tipo de beleza fotográfica. As cenas têm uma filmagem sombria e nos deixa com a impressão de que aquela paisagem "suja" foi feita de propósito. A impressão que eu tive foi de que tudo está estragado por conta daqueles seres humanos horríveis, e a luminosidade ruim amplia o sentimento de repulsa que temos diante daquelas pessoas. E isso é um ponto positivo, ok? É igual quando odiamos um vilão. Sinal de um trabalho bem feito. Falando em vilão, vale ressaltar que não há nenhum rastro de mocinho na trama. Não tentem encontrar algum personagem para torcer por um final feliz. Não existe felicidade no roteiro. Não é o Clube do Bolinha. O filme traz uma infelicidade de alma dentro daqueles personagens com uma carga pesada e profundamente abominável.

O Clube não veio para agradar todos os estômagos, isso precisa ficar bem claro. Visualmente, o filme é desprovido de qualquer tipo de sensação agradável. Trata-se de pessoas psicologicamente doentes, e tudo em volta parece contaminado de alguma forma: a filmagem, os personagens, a cidade, a fotografia, o público. A sensação que temos é de que tudo ali parece estar podre. É preciso fazer um trabalho muito bem elaborado para se conseguir chegar nesse extremo desconforto com a putrefação humana. E Pablo Larraín acertou, fazendo nascer um filme interessantíssimo do desagradável. O Clube é vencedor do Urso de Prata no Festival de Berlim deste ano, e veio mesmo para desconcertar a Igreja Católica e tirar a lama escondida debaixo dos tapetes.

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Que Horas Ela Volta?

Regina Casé vive a empregada doméstica Val, que trabalha há anos para uma família rica em São Paulo. Ela não vê sua filha há uma década, e ajudou a criar Fabinho, o filho único da patroa. O garoto é a comprovação da tão famosa frase que diz que dinheiro não traz felicidade. O rapaz cresce tendo Val como referência materna e não consegue ter o mesmo laço com a mãe biológica. O preconceito de classes sociais surge com a chegada de Jéssica (Camila Márdila), filha de Val, que sai do Pernambuco para prestar vestibular em São Paulo. A jovem faz uma verdadeira revolução dentro da monotonia do casarão.


“Que Horas Ela Volta?” aborda o cotidiano comum da melhor forma possível. As cenas são filmadas com simplicidade de gestos e mostra a rotina familiar de forma minuciosa. O jogo de cena com a personagem de costas é uma ideia bem interessante. Deixa desde o começo a sensação de que ali não era o lugar dela, que mesmo inconscientemente Val não estava por completo naquela casa e com aquela família. A dondoca Bárbara (Karine Teles) deixa claro o tempo todo que patrão é patrão e empregado é empregado. Fica nítido que a pernambucana arretada nunca foi realmente considerada da família, e a única que não tem essa percepção é a própria Val.

O filme é muito bem encenado na forma de mostrar a rotina doméstica somada ao vazio de pessoas que dividem o mesmo teto e mal se conhecem. Isso vai desde um vaivém de louças até uma preferência de sorvete. Tudo é trabalhado de forma genuína e resgata a simplicidade do afeto, o cuidado com a família, o interesse de saber do que o outro gosta. Fico muito feliz quando vejo um filme nacional dando certo. A trama de Anna Muylaert é um registro importantíssimo, mostrando que somos capazes de ser mais do que o país do futebol. Sabemos contar boas histórias sem prostituição, sem tiro e sem violência. Sabemos apresentar um filme de qualidade internacionalmente e concorrer com igualdade à estatueta do Oscar. Parabéns, Regina Casé, por homenagear com maestria essas tantas milhões de mulheres dignas, guerreiras e batalhadoras. Parabéns por resgatar sentimentos que parecem estar em desuso ou fora de moda. Muito obrigado por nos fazer sentir orgulho do cinema brasileiro.

domingo, 13 de setembro de 2015

Evereste

"Evereste" é baseado em fatos reais e se inspira em dois livros que tratam do mesmo assunto. A trama conta a história da fatalidade que vitimou oito montanhistas durante uma escalada ao topo do Monte Everest. O acontecimento foi considerado por muito tempo como a maior tragédia de "ataque" ao cume. O filme se passa na época de início de toda a questão comercial que envolvia a escalada do Everest como uma rota turística. Os grupos eram formados por um número grande de pessoas, e elas desembolsavam uma fortuna pra participar da atração.

A produção é muito bem elaborada e a fotografia do filme é linda. Podemos perceber em várias cenas uma visão completa de toda aquela imensidão congelada. O roteiro é bem trabalhado e não fica uma coisa monótona ou técnica demais. A gente se envolve com a vida dos personagens, nos colocamos no lugar da família deles. A personagem da Keira Knightley é essencial para o filme, é uma espécie de porto seguro, com café, travesseiros e cama macia.

Vou abrir uma brecha pra fazer uma colocação pessoal. Em muitas vezes eu me perguntava o motivo de alguém se interessar em participar de uma aventura maluca dessa. Um trajeto perigoso, que tem milhões de chances de dar errado, custa um dinheirão, precisa de um treinamento intensivo e tem o clima como vilão durante meses de jornada. Não sou um aventureiro desse naipe e gosto bastante do meu chuveiro quente. Nunca entendi muito bem essa gana toda de viver uma aventura que pudesse custar a própria vida.  Por que escalar tudo aquilo, chegar ao cume, e descer tudo de novo? Na minha cabeça parecia bastante esquisita essa "programação de índio".

Mas o filme te transporta pra realidade daquelas pessoas, porque eu não preciso gostar de aventuras perigosas pra entender a emoção de alguém que gosta. A cena da japonesa me emocionou bastante, e não quero contar mais do que isso pra não estragar a surpresa. "Evereste" não traz um bando de gente perdida em uma montanha congelada comendo carne humana. Esqueça isso. Todos ali sabem o que estão fazendo e não estão perdidos
em lugar algum. Eles querem estar ali e querem enfrentar aquela situação. É uma escolha e não um acaso. É um dos melhores trabalhos em equipe que já pude ver. É um estilo de vida. Uma cumplicidade que dá orgulho de assistir. Eles querem quebrar barreiras. Querem vencer um recorde pessoal, que só está dentro da cabeça de cada um daqueles aventureiros. O filme é fantástico, é sufocante, é angustiante, é perfeito. Tecnicamente brilhante e com um elenco incrível. Um dos melhores filmes que vi esse ano.

domingo, 30 de agosto de 2015

Sobrenatural - A Origem

Em Sobrenatural: A Origem, de Leigh Whannell, o conteúdo não é muito diferente do que já vimos antes. A atmosfera é a mesma e os desfechos também. A origem sobrenatural antecede a história da família Lambert e nos deparamos com a médium Elise (Lin Shaye), que já vimos morrer, vivinha da Silva. A trama conta a vida da adolescente Quinn (Stefanie Scott), com atuações medianas. A garota sente falta da mãe, falecida há pouco tempo, e é assombrada por uma entidade maligna, assustadora e feia pra caramba. Nenhuma novidade é relevante, então acredito que a sinopse de abertura dispensa minuciosas apresentações.

O grande acerto desse terceiro filme está nos detalhes dos sustos que levamos. Somos pegos totalmente desprevenidos, em cenas que não imaginávamos levar susto. Na primeira cena do acidente de carro eu quase pulei da cadeira do cinema. Não posso contar mais do que isso pra não estragar a surpresa de quem ainda não assistiu. A questão é que esses sustos repentinos não são considerados como ponto positivo pra se qualificar uma trama em um patamar de "bom filme", já que fazer levar susto não significa mérito algum. Sabe aquela sensação quando esquecemos o som no volume máximo antes de ligar alguma coisa? É exatamente essa a experiência, porém, de certa forma, funciona. Só acho preocupante, porque isso está virando hábito nos filmes de terror. Será que aprimorar a forma de dar susto no público é a melhor forma de acertar? Minha resposta é "não", mas essa é somente a minha opinião.  

A trilha sonora é muito boa, mas alguns exageros acabam deixando a trama um pouco cômica e isso não é bacana. A Elise lutando e fazendo caras e bocas pra empurrar uma entidade demoníaca fogem um pouco do terror e beiram a comédia. As salpicadas de humor são válidas e importantes, mas precisam ter um ponto certo, sem dispersar demais a atenção. Essa origem de Sobrenatural não é ruim, o problema é que dificilmente encontramos um perfeito exemplar de terror. Quero muito sentir novamente a adrenalina que senti na franquia de Jogos Mortais. Não gosto de fazer comparações, mas quando a gente acostuma com algo bom, precisa vir algo melhor ainda pra superar as nossas expectativas. Infelizmente não é o caso.

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Divertida Mente

Posso dizer que Divertida Mente veio sem querer. A Pixar vinha com outro projeto, mas o presidente do estúdio aprimorou as ideias e mudou praticamente tudo. Percebemos essa mudança logo no início da história, com uma apresentação de um casal de vulcões cantando. Uma ótima pedida pra chamar atenção da criançada. No filme, a nossa mascote é a Riley. A trama conta todos os sentimentos que se passam na cabeça da menina e os personagens são exatamente as emoções que ela vive: Alegria, Tristeza, Medo, Nojo e Raiva.

O conteúdo do filme foi cuidadosamente trabalhado. Criaram um mundo paralelo para explicar os sentimentos de forma lúdica. Parece que estamos dentro de um parque infantil. As emoções têm cores e formas que chamam atenção, mesmo que as crianças mais novinhas não entendam a mensagem embutida que a trama traz. Os personagens são extraordinariamente agradáveis e é impossível não se apaixonar pela animação.

A balança trabalhada entre alegria e tristeza talvez seja o melhor ensinamento do filme (e dessa vez estou falando com os adultos). A importância dos outros sentimentos, além da alegria, é colocada de forma emocionante e impecável. É a chave do sucesso da história, já que poucas animações conseguem ensinar sem somente entreter. A Pixar é mestre em transmitir lições de vida no ponto certo. A aventura se desenrola perfeitamente e é impressionante como um mesmo filme pode atingir os extremos na faixa etária. Percebi isso dentro da sala de cinema com crianças e adultos rindo e se emocionando com cenas diferentes.

É um passeio divertido, um filme psicologicamente inteligente e que vai mexer com a cabeça de qualquer um. Uma obra fantástica, que trabalha com o conceito de entretenimento de forma genial. Alegria, Tristeza, Medo, Nojo e Raiva vão te conquistar e com certeza não vão sair tão cedo do seu cérebro. Divirta-se!

domingo, 26 de abril de 2015

Vingadores - Era de Ultron

Essa sequência de Vingadores já era mais do que aguardada e dispensa apresentações. Dessa vez, os nossos heróis precisam se unir para enfrentar Ultron, um vilão dos bons, afinal não é qualquer um que consegue levantar o martelo do Thor. Vale destacar a importância da vida pessoal do personagem Gavião Arqueiro na trama. Esse toque de esposa e filhos trouxe um lado humano bem interessante pra história, já que estamos muito acostumados com a fantasia dos super poderes e esquecemos um pouco do mundo real. Não posso deixar de citar também o meu imenso fascínio pela Viúva Negra, mas a heroína da vez é Wanda Maximoff (que está aprovadíssima).

Vingadores é mais um filme que reúne um monte de super-heróis famosos? Sim, mas era exatamente isso que a gente queria. O universo cinematográfico da Marvel está em sua melhor fase. E para os que não acompanham a saga, as expectativas precisam ser alinhadas. Era de Ultron não é a conclusão de nenhuma sequência, apesar de ser um filme completo. No final (calma, não vou contar nada) você vai sentir uma pulga atrás da orelha dizendo que o filme não terminou realmente... e parabéns! Você acertou. Era de Ultron é só o começo de uma nova jornada, o início de (talvez) a maior aventura que vamos ver na história do cinema de quadrinhos. Vingadores continua sendo um filme incrível e eu prefiro não rotular se a primeira sequência foi melhor ou pior do que essa segunda. São dois deliciosos presentes.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Golpe Duplo



Golpe Duplo é um filme sem mocinhos. Will Smith interpreta Nicky, um golpista chefe de uma organização criminosa. Ele conhece Jess (Margot Robbie), uma novata na arte do crime. Os dois formam uma dupla que vai além do estelionato e não é difícil se apaixonar pelo casal. Rodrigo Santoro vive o bilionário Garriga, dono de uma equipe de Fórmula 1. E o nosso ator brasileiro faz muito além de uma simples participação especial. Garriga é um dos pontos chaves da trama.


O interessante em Golpe Duplo é que não se trata de um grande roubo, como nos filmes comuns do gênero. Jess é feliz por por ser uma criminosa de pequenos truques e Nicky trata um milhão de dólares como algo bem corriqueiro. Tudo é trapaça, toda a história é baseada em alguma malícia ou alguma enganação. Jess e Nicky manipulam um ao outro o tempo todo. Nunca sabemos se estão falando a verdade. O casal de vigaristas é adorável e, sem dúvidas, a chave do sucesso do filme. Golpe Duplo introduz novos conceitos e faz a gente se dar conta de que não precisamos de dois protagonistas perfeitos e bonzinhos. Ladrão que rouba ladrão pode render um filmão.

quarta-feira, 11 de março de 2015

Sniper Americano

Chris Kyle mostra seu heroísmo já no início da trama, defendendo o irmão na escola. Desde a infância, percebemos que a vocação de Kyle é livrar os inocentes do mal. E é no exército que ele encontra o caminho perfeito para assumir e aperfeiçoar o seu dom. Chris se torna uma lenda dentro da força de operações especiais da marinha americana. Em quatro passagens pelo Iraque, o sniper americano somou quase duzentas mortes. Um atirador de elite de uma mira precisa, protegendo seus colegas e mostrando um patriotismo bonito de se ver.

Não posso esquecer de destacar o ator Bradley Cooper, que está brilhante em cena. Ele encarna o personagem de tal forma que muitas vezes esquecemos quem é quem. Sniper Americano não é um filme que agrada a todos os estômagos. Mostra a guerra sem maquiagens, com batalhas sem questionamentos. Não está em discussão se o inimigo é adulto ou criança, ainda que isso mexa com o lado humano do personagem. Mas é importante citar isso para que o público saiba o que esperar. E não é somente aí que o lado sentimental de Kyle aparece. O atirador vive um dilema dentro de si mesmo e carrega sempre o peso do campo de batalha em seus pensamentos. Um barulho de furadeira e até o assobio de uma panela de pressão pareciam suspeitos nos pensamentos de um homem que não conseguia mais viver um cotidiano comum ao lado de sua esposa e seus filhos.

Li algumas críticas dizendo que Sniper Americano é a glorificação da violência americana no Iraque. Pois que seja. O filme é ótimo e fica impossível dizer o contrário disso. Clint Eastwood mais uma vez acerta com maestria. Trata-se de uma história real, forte e intensa (e muito bem contada) de um atirador de elite condecorado por sua atuação na Guerra do Iraque. Como não mostrar violência em um filme de guerra? Vamos ser coerentes, por favor. Sem contar que a trama não se resume a tão pouco, as cenas de desespero da personagem Taya (Sienna Miller) querendo o marido fora da guerra emocionam bastante. O que vale a pena ser discutido nesse filme não é a violência, e sim a vida dos soldados que retornam do Iraque e carregam um fardo pesado. Eles são psicologicamente afetados pela guerra e muitas vezes de maneira irreversível. Sniper Americano é um filme que precisa ser visto.

sexta-feira, 6 de março de 2015

Birdman

Birdman conta a história de Riggan Thomson (Michael Keaton), um ator que fez sucesso com um único personagem: Birdman, caindo no esquecimento da indústria Hollywoodiana após recusar fazer mais uma sequência da franquia. Riggan busca no teatro o seu antigo prestígio, mas as frustrações do personagem vão muito além de cobiça por reconhecimento. O cara tem um casamento fracassado e um relacionamento pra lá de conturbado com a filha Sam (Emma Stone, que por sinal está ótima). É uma tragédia cômica, que se torna grandiosa pela maestria na condução.

A primeira cena de Michael Keaton é flutuando. Percebemos desde aquele primeiro segundo de que não estamos diante de um filme qualquer. Nos deparamos com um humor negro no ponto certo e um roteiro inteligente, recheado de boas atuações. A filmagem da câmera como se fosse uma espécie de espião indo atrás dos personagens é bacana demais. Parece que dá tempo para o público pensar nas cenas, já que a trama pode ter conclusões variadas. Michael Keaton está impecável, totalmente entregue ao personagem e beira a perfeição.

Riggan Thomson tem uma espécie de dupla personalidade e guarda dentro de si o Birdman, personagem o qual é sempre lembrado por onde passa. A caminhada no decorrer da trama é meio fantasiosa e também irônica, trazendo um personagem dilacerado em um ser humano descuidado de si mesmo. Sua segunda personalidade parece sempre mais poderosa e mais implacável, enquanto o real Riggan Thomson aparenta estar cada vez mais perturbado psicologicamente.

A luta maior é de Michael Keaton pra Michael Keaton (ou de Riggan Thomson contra Birdman). E quem vence nessa batalha somos nós, espectadores. Ainda não assisti todos os filmes que concorreram ao Oscar, mas posso dizer que Birdman é um filmaço, com conteúdo seguro e bem feito, aberto para vários tipos de definições. A "dramédia" do mexicano Alejandro González Iñárritu não é uma obra fácil de se entender, mas é nesse ponto em que o diretor leva medalha de ouro. Se permita voar, porque o filme é um prato cheio pra qualquer cinéfilo.