terça-feira, 29 de setembro de 2015

Que Horas Ela Volta?

Regina Casé vive a empregada doméstica Val, que trabalha há anos para uma família rica em São Paulo. Ela não vê sua filha há uma década, e ajudou a criar Fabinho, o filho único da patroa. O garoto é a comprovação da tão famosa frase que diz que dinheiro não traz felicidade. O rapaz cresce tendo Val como referência materna e não consegue ter o mesmo laço com a mãe biológica. O preconceito de classes sociais surge com a chegada de Jéssica (Camila Márdila), filha de Val, que sai do Pernambuco para prestar vestibular em São Paulo. A jovem faz uma verdadeira revolução dentro da monotonia do casarão.


“Que Horas Ela Volta?” aborda o cotidiano comum da melhor forma possível. As cenas são filmadas com simplicidade de gestos e mostra a rotina familiar de forma minuciosa. O jogo de cena com a personagem de costas é uma ideia bem interessante. Deixa desde o começo a sensação de que ali não era o lugar dela, que mesmo inconscientemente Val não estava por completo naquela casa e com aquela família. A dondoca Bárbara (Karine Teles) deixa claro o tempo todo que patrão é patrão e empregado é empregado. Fica nítido que a pernambucana arretada nunca foi realmente considerada da família, e a única que não tem essa percepção é a própria Val.

O filme é muito bem encenado na forma de mostrar a rotina doméstica somada ao vazio de pessoas que dividem o mesmo teto e mal se conhecem. Isso vai desde um vaivém de louças até uma preferência de sorvete. Tudo é trabalhado de forma genuína e resgata a simplicidade do afeto, o cuidado com a família, o interesse de saber do que o outro gosta. Fico muito feliz quando vejo um filme nacional dando certo. A trama de Anna Muylaert é um registro importantíssimo, mostrando que somos capazes de ser mais do que o país do futebol. Sabemos contar boas histórias sem prostituição, sem tiro e sem violência. Sabemos apresentar um filme de qualidade internacionalmente e concorrer com igualdade à estatueta do Oscar. Parabéns, Regina Casé, por homenagear com maestria essas tantas milhões de mulheres dignas, guerreiras e batalhadoras. Parabéns por resgatar sentimentos que parecem estar em desuso ou fora de moda. Muito obrigado por nos fazer sentir orgulho do cinema brasileiro.

domingo, 13 de setembro de 2015

Evereste

"Evereste" é baseado em fatos reais e se inspira em dois livros que tratam do mesmo assunto. A trama conta a história da fatalidade que vitimou oito montanhistas durante uma escalada ao topo do Monte Everest. O acontecimento foi considerado por muito tempo como a maior tragédia de "ataque" ao cume. O filme se passa na época de início de toda a questão comercial que envolvia a escalada do Everest como uma rota turística. Os grupos eram formados por um número grande de pessoas, e elas desembolsavam uma fortuna pra participar da atração.

A produção é muito bem elaborada e a fotografia do filme é linda. Podemos perceber em várias cenas uma visão completa de toda aquela imensidão congelada. O roteiro é bem trabalhado e não fica uma coisa monótona ou técnica demais. A gente se envolve com a vida dos personagens, nos colocamos no lugar da família deles. A personagem da Keira Knightley é essencial para o filme, é uma espécie de porto seguro, com café, travesseiros e cama macia.

Vou abrir uma brecha pra fazer uma colocação pessoal. Em muitas vezes eu me perguntava o motivo de alguém se interessar em participar de uma aventura maluca dessa. Um trajeto perigoso, que tem milhões de chances de dar errado, custa um dinheirão, precisa de um treinamento intensivo e tem o clima como vilão durante meses de jornada. Não sou um aventureiro desse naipe e gosto bastante do meu chuveiro quente. Nunca entendi muito bem essa gana toda de viver uma aventura que pudesse custar a própria vida.  Por que escalar tudo aquilo, chegar ao cume, e descer tudo de novo? Na minha cabeça parecia bastante esquisita essa "programação de índio".

Mas o filme te transporta pra realidade daquelas pessoas, porque eu não preciso gostar de aventuras perigosas pra entender a emoção de alguém que gosta. A cena da japonesa me emocionou bastante, e não quero contar mais do que isso pra não estragar a surpresa. "Evereste" não traz um bando de gente perdida em uma montanha congelada comendo carne humana. Esqueça isso. Todos ali sabem o que estão fazendo e não estão perdidos
em lugar algum. Eles querem estar ali e querem enfrentar aquela situação. É uma escolha e não um acaso. É um dos melhores trabalhos em equipe que já pude ver. É um estilo de vida. Uma cumplicidade que dá orgulho de assistir. Eles querem quebrar barreiras. Querem vencer um recorde pessoal, que só está dentro da cabeça de cada um daqueles aventureiros. O filme é fantástico, é sufocante, é angustiante, é perfeito. Tecnicamente brilhante e com um elenco incrível. Um dos melhores filmes que vi esse ano.